Namoro Virtual
Namoro Virtual: Por que milhões de brasileiros resolveram procurar um romance pela internet?
A executiva paulistana Esther Jagosehit, 30 anos, é um mulherão. Loura, alta, magra, tem olhos azuis, sólida formação intelectual e ganha o suficiente para levar uma vida para lá de confortável, com freqüentes viagens ao exterior, carro do ano e casa própria. Esther provoca tanto furor entre o público masculino quanto mexe com as mulheres a presença do ator Renato Bizone, herdeiro do grupo Brasimac, um império que fatura anualmente 100 milhões de reais. Aos 27 anos, sempre citado em colunas sociais, ele ostenta um currículo amoroso que inclui a apresentadora do Fantástico, Glória Maria, e uma dezena de modelos.
Alguém diria que ambos estão procurando um relacionamento pela internet? Pois, pasme: eles estão. A presença nos sites de namoro de gente como Esther, inscrita sob a alcunha de "garota do campo", e Bizone, que usa o apelido "boyIIgirl", aponta para um curioso fenômeno: a internet deixou de ser refúgio para quem sempre teve problemas amorosos para se tornar uma eficiente ferramenta mesmo para quem nunca encontrou dificuldade em arrumar namoro.
Atualmente, quase todo mundo tem um amigo, um parente, um vizinho que conheceu alguém pela internet. Esse tipo de encontro se tornou assunto recorrente em qualquer mesa de bar. A percepção da mudança no perfil de quem procura namoro pontocom pode ser amparada por dados significativos. Estima-se que cerca de 3,5 milhões de pessoas estejam inscritas nos sites de relacionamento em todo o país. É um número que corresponde a quase 10% dos solteiros brasileiros. Estudos recentes apontam que, em três anos, pelo menos 50% dos desimpedidos dos países do Primeiro Mundo vão conhecer um parceiro on-line. A conversa poderá parar no estágio eletrônico. Algumas poderão ir adiante. É por isso que a procura pelos sites especializados só cresce. Nos últimos meses, foram lançados cinco sites, somando um total de mais de vinte no Brasil.
![]() ESTHER JAGOSEHIT, executiva, 30 anos (Foto Claudio Rossi) |
Os encontros pela internet subverteram a ordem de como se engata um namoro. Se na paquera tradicional a aparência física é um desempatador, nas conversas on-line se torna um mero detalhe. Como as primeiras conversas são anônimas, as pessoas se sentem mais propensas a ser honestas e a deixar transparecer suas emoções. "Mesmo que dê errado, a pessoa se sente menos ofendida. Ela foi recusada pelo discurso, não pela aparência. Não se sente ferida narcisisticamente. É como se dissesse: 'Não fui eu o recusado, foi a personagem que criei'. Isso é interessante", comenta o psicanalista carioca Joel Birman. A vendedora carioca Carolina Campos, 22 anos, ressalta outro aspecto: "Passei horas falando com pessoas interessantes quando eu já estava de pijama, descabelada, sem maquiagem. É uma maravilha não precisar gastar um tempão para se arrumar e conhecer alguém", diz ela...
![]() CAROLINA CAMPOS, vendedora, 22 anos. (Foto: Oscar Cabral) |
Em geral, tem-se a impressão de que as teorias sobre a falibilidade dos encontros pela internet são mais baseadas em preconceitos que em fatos. Como se só fosse possível conhecer a pessoa ideal na faculdade (visão tradicional) ou numa trombada de carrinhos de supermercado (visão super-romântica). É como se houvesse algum código velado que proibisse as pessoas – principalmente as mulheres – de colocar sua foto, dizer o que esperam de alguém e, finalmente, poder achar uma pessoa interessante para se relacionar.
![]() CARLOS EDUARDO NIEMEYER, fotógrafo, 48 anos. (Foto: Oscar Cabral) |
A principal vantagem da internet é possibilitar os encontros. É evidente que o resto da paquera vai ficar por conta dos envolvidos. Como em uma relação em que os dois foram apresentados por amigos em comum. A advogada paulistana Renata Malagoli, 25 anos, namora há seis meses o publicitário Rogério Barcellos, 30 anos, que conheceu num site de namoro.
Ambos são jovens, bonitos e bem-sucedidos e vêm de famílias com dinheiro. "Eu sempre achei que ia encontrar um cara como ele na praia, em uma viagem pela Europa, sei lá. Mas nunca aconteceu. Percebo que algumas pessoas olham estranho quando digo que o conheci na internet. É puro preconceito. O que importa é que estamos no maior amor", diz.
Antonio Milena![]() RENATA MALAGOLI, advogada, 25 anos |
"Na minha opinião, o mais interessante da internet é a possibilidade de você praticamente encomendar alguém. Há tantos filtros para chegar a um perfil que seja compatível com o que você espera que no mínimo amizade você vai fazer com a outra pessoa. É evidente que há exceções. Conheci cerca de quinze mulheres pessoalmente. Posso dizer que pelo menos dez foram um erro, mentiram. A maioria disse que estava em forma. Na verdade, estavam bem acima do peso. Mas cinco foram sensacionais. Acho que isso já é excelente. Imagine: se você for a uma boate ou um barzinho dificilmente vai conhecer uma pessoa interessante. Que dirá cinco! Ter encontrado alguém como a Renata me parecia quase impossível. E agora veja só: tudo por causa de um anúncio num site de namoro." |
Ao que tudo indica, as relações que parecem dar certo são as construídas com o menor grau possível de expectativa. "É um erro achar que só porque você teclou dias com alguém virou íntimo da pessoa. É preciso saber que, ao se encontrarem, vocês serão dois estranhos da mesma maneira. É necessário começar todo o processo de conhecimento de novo", observa a psicanalista Magdalena Ramos, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. É evidente que há uma série de posturas que a pessoa deve ter em mente antes de iniciar uma paquera pela internet.
A principal delas diz respeito a você mesmo. Os especialistas aconselham a pessoas carentes e solitárias jamais se envolver em relações virtuais. "Como está fragilizado, esse tipo de temperamento se torna um alvo fácil para pessoas mal-intencionadas", explica a psicoterapeuta paulista Lídia Aratangy. Também é importante se preservar ao máximo, mesmo que a conversa pela internet seja empolgante. Jamais dê seu endereço ou o telefone de sua casa. É tão arriscado quanto sair distribuindo seu cartão de visita pela arquibancada de um jogo de futebol.
E principalmente: nunca acredite de cara em tudo o que a outra pessoa escrever. O tempo e a convivência vão dizer se você deve ou não dar a ela um voto de confiança. Antes disso, só preste atenção. E saiba: tendo ou não encontrado alguém para um relacionamento amoroso, ninguém se arrepende de ter se inscrito nos sites. Todos concordam que é um excelente manancial para fazer amigos, conhecer pessoas diferentes e, sobretudo, inflar o ego. Receber trinta mensagens de pessoas que o acharam o máximo e querem conhecê-lo triplica a chance de você ter companhia durante suas vazias noites de sábado. E, nesse caso, não faz a mínima diferença ser um parceiro pontocom.
Por Daniela Pinheiro
Revista Veja - Edição 1778 20 de novembro de 2002